Jornal do CommercioPublicado em 10.08.2008
Em vez de legisladores pagos com dinheiro público, grande parte dos países tem conselhos de cidadãos, formados por representantes das comunidades, que não recebem salário pela atividade O cargo de vereador é, praticamente, uma exclusividade da legislação brasileira. Na grande maioria dos países, a figura do legislador municipal inexiste. Em seu lugar, há os chamados “conselhos de cidadãos”, formados por representantes das comunidades e bairros, que geralmente trabalham sem remuneração ou ônus para os cofres públicos.
Os conselheiros são escolhidos pela própria população e costumam reunir-se periodicamente para discutir temas relativos à cidade, numa pauta equivalente à que é cumprida pelos vereadores no Brasil. No entanto, nenhum deles sobrevive da política e sim das suas atividades profissionais. As reuniões acontecem em auditórios públicos, sem a estrutura física de uma Câmara Municipal, nem funcionários ou servidores comissionados à disposição.
De acordo com o advogado José Paulo Cavalcanti – estudioso das Constituições dos países –, o formato do Legislativo brasileiro é único. Ele explica que são poucos os países com estrutura federativa equivalente à do Brasil. Na maioria, não existe a figura do município. São províncias, condados e cidades, vinculados diretamente ao poder central. “Como não há remuneração, o número de conselheiros é maior e as comunidades ficam melhor representadas”, avalia.
Até meados de 1977, o trabalho dos vereadores não era remunerado, à exceção das Câmaras das capitais e de cidades com mais de 500 mil habitantes. Após o Pacote de Abril – conjunto de leis outorgado pelo presidente-general Ernesto Geisel em abril de 77, visando a evitar o avanço da oposição ao regime – todos passaram a receber vencimentos, calculados num limite de até 75% dos salários dos deputados estaduais, que, por sua vez, representam 75% do que recebe um deputado federal.
Segundo José Paulo, em alguns países – como Portugal – ainda se costuma pagar um jetom por sessão aos conselheiros, para repor o dia de trabalho que deixam de cumprir nas suas profissões. Mas as vantagens param por aí. “Tirar dinheiro da saúde, da educação, para pagar vereadores, não existe. São 5% do orçamento do município, que destina 10% à saúde. Não seria melhor que a saúde tivesse 15% e não existissem vereadores?”, questiona José Paulo, arrematando: “No Brasil, os vereadores são assistentes sociais de luxo. Não há nada que eles façam que um conselheiro não possa fazer melhor”.
A advogada Rachel Farhi, ex-procuradora do Estado do Rio de Janeiro e chefe da área jurídica do Instituto Brasileiro de Administração Municipal (Ibam), salienta que extinguir a remuneração dos vereadores é inconstitucional.
“Antigamente, o exercício da vereança era meramente honorífico. Mas é deste subsídio que o vereador tem seu sustento”, afirma Rachel. Para ela, o que se configura como irregular é a adição das verbas indenizatórias aos salários dos vereadores. “O vereador tem que financiar as despesas com alimentação, por exemplo, com os seus próprios recursos. A verba indenizatória deve ser gasta com despesas inerentes ao cargo e não para auferir vantagem pessoal.”
Outro assunto que Rachel Farhid discute é a vinculação dos subsídios nas Câmaras aos salários de deputados. “A lei fala em limite, teto. Isso significa que não necessariamente o vereador tem que ganhar o teto. Não significa que tem que ser igual ao limite. Até porque vincular a remuneração do vereador à do deputado é também inconstitucional. São unidades orçamentárias distintas, de entes da federação também distintos”, conclui. (S.M.F.)